Presente no Mineirão em 1971, João Leite festeja bi do Atlético-MG junto com mãe

Como jogador atleticano, o então goleiro João Leite bateu na trave duas vezes quando decidiu o Nacional. Como torcedor, porém, ele é 100% campeão. Em 1971, com 16 anos, esteve na geral do Mineirão na vitória de 1 a 0 do seu clube de coração sobre o São Paulo no primeiro jogo do triangular final. Na partida seguinte, festejou o título com o triunfo sobre o Botafogo no Rio. Passados 50 anos, foi nos braços da mãe, dona Geralda, que ele voltou a soltar o grito de campeão brasileiro.

“Foi uma emoção sem tamanho. E poder comemorar esse título ao lado da minha mãe, não tem preço. Ela acompanhou tudo, não perdeu nenhum detalhe. Ficou muito brava quando o Atlético-MG levou os dois gols, mas como boa atleticana, torceu até o fim e ficou muito feliz”, disse o ex-goleiro em conversa com o Estadão.

Uma vez por semana, João Leite percorre os pouco mais de cinquenta quilômetros que separam Belo Horizonte de Pedro Leopoldo para passar a noite com dona Geralda. Os cinco filhos cumprem esse revezamento para aproveitar a companhia dessa matriarca que, no próximo dia 26 de março, vai completar 90 anos.

“É uma alegria muito grande poder fazer isso e aproveitar o carinho dela. Apesar da idade e de todo o seu esquecimento, ela costuma se levantar de madrugada para me “embrulhar” e ajustar o cobertor para que eu não sinta frio. Veja você. Eu, já com meus 66 anos, e ela não esquece de cuidar de mim”, disse João Leite.

A partida diante do Bahia foi marcada por reviravoltas, uma virada relâmpago e muita alegria. O jogo que teve sabor de título contou com a torcida de filhos, netos e noras de dona Geralda. E em meio a tanto sofrimento, a veterana torcedora acabou vítima de brincadeiras que a tiraram do sério.

“Meus irmãos ficavam falando que o Éverson é o goleiro mais bonito da história do Atlético-MG. Vixe, ela ficou brava. Só quando percebeu que era chacota que entrou na brincadeira”, divertiu-se João Leite.

Com 684 jogos pelo clube, o ex-camisa 1 está no topo da lista dos atletas que mais entraram em campo pelo time de Minas. Durante a conversa, ele fez uma revisão de sua trajetória. Apesar de algumas frustrações, o saldo é altamente positivo.

“Eu já nasci atleticano e ia ver os jogos do time no estádio Antonio Carlos, onde hoje é o shopping. Tempos depois iria concentrar debaixo das arquibancadas. O Atlético-MG é a paixão da minha vida.”

O jogo mais marcante, no entanto, o remete a uma das maiores dores da carreira. No empate de 0 a 0 contra o São Paulo, a decisão do Campeonato Brasileiro foi para os pênaltis e João Leite pegou duas cobranças. Seu esforço, porém, foi em vão. A equipe do Morumbi teve mais frieza, venceu a disputa de penalidades por 3 a 2, e ficou com o título.

“Em 1977 tínhamos o melhor ataque, a defesa menos vazada, o artilheiro do campeonato e somamos dez pontos a mais do que o São Paulo. Mas o Brasil é um país que precisa ser estudado. Ah e ainda fomos vice-campeões invictos.”

Considerado um dos maiores nomes da posição no time mineiro, João Leite falou do goleiro Éverson e também da importância do técnico Cuca nessa campanha vencedora.

“O Éverson é um grande goleiro e mostrou muita personalidade. Chegou, encontrou dificuldades, mas logo se aclimatou e tomou conta da posição. Ele é muito bom com os pés e cresceu em momentos importantes. O Cuca também foi fundamental. Ele é muito bom de vestiário. Entende o que está acontecendo e consegue mudar o jogo. E o time entendeu bem a sua filosofia e teve uma boa sintonia com a torcida.”

Destaque do título pelos gols e também pela liderança em campo. Hulk foi elogiado por João Leite. No entanto, ao ser questionado se o ídolo atual poderia ser comparado a Reinaldo, principal atacante de sua geração, João Leite disse que o patamar é diferente.

“O Reinaldo está numa prateleira especial de ídolos do clube. Ele era ídolo dos próprios companheiros. Nós o vimos nascer na base do Atlético-MG. Com 17 anos, ele precisou ser submetido a três cirurgias com anestesia geral. Enquanto nós saíamos do vestiário para encontrar a família, ele ficava sentado no chão com bolsas de gelo nos joelhos para aliviar as dores no joelho. Foi um resistente e um fora de série. Era muito querido por todos no elenco”, afirmou.

FAMÍLIA LIGADA AO ESPORTE E MOVIMENTO RELIGIOSO – Casado com a ex-jogadora de vôlei Eliana, que defendeu a seleção brasileira nos Jogos de Moscou, em 1980, João Leite viu as raízes desse matrimônio render frutos para o esporte.

“Débora, minha filha mais velha, foi jogadora de vôlei da seleção mineira e hoje é casada e mora no Canadá. Tem uma filha, a Sarah. A Daniela foi atleta olímpica de ginástica rítmica e me deu três netinhas: Letícia, Beatriz e Marina. E tem o Helton Leite, goleiro como o pai. Atualmente defende o Benfica, de Portugal”, falou com orgulho.

Com uma trajetória de destaque dentro de campo, onde defendeu a seleção brasileira entre 1981 e 1982, João Leite também ganhou holofotes ao ser um dos líderes do movimento Atletas de Cristo.

A iniciativa arrebatou vários nomes do esporte e também foi alvo de polêmicas, inclusive com o próprio goleiro.

“Em 1979 eu conheci o Baltazar, o artilheiro de Deus. Uma pessoa fantástica. E o movimento foi crescendo. Mas teve dificuldades, já que no domingo, que é considerado o dia a se dedicar a Deus, nós tínhamos que jogar. Tinha dificuldade também com os dirigentes pelos posicionamentos que tínhamos. E teve a polêmica do veto a uma inscrição que eu usava na camisa: “Cristo Salva”. A imprensa cobriu e aquilo teve uma repercussão enorme”, afirmou João Leite.

Dos campos para a vida pública, o ex-ídolo atleticano é deputado estadual e membro da Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa. Apesar da agenda corrida e das constantes viagens, ele garante sempre ter tempo para olhar pelo clube do coração.

“Mesmo quando a gente encerra a carreira no Atlético-MG, nós continuamos como atletas no imaginário da torcida. Onde vou, sempre me tratam como goleiro do Galo. E é assim que eu me sinto. Sou um apaixonado pelo clube”, encerrou.

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