Insônia: novo foco de lucro contínuo das farmacêuticas

Por Isabel Braga*

Com lucros milionários e distribuição de dividendos crescentes, empresas farmacêuticas têm investido pesado nos medicamentos para dormir como zolpidem e benzodiazepínicos e no desenvolvimento de novos medicamentos e patentes envolvendo o sono. O uso contínuo de sedativos garante à indústria uma lucratividade bilionária e contínua com drogas que muitas vezes induzem dependência, ainda que afetem a arquitetura do sono e deixem o indivíduo com a falsa sensação de descanso.

A cultura do alívio sintomático imediato em detrimento do foco no bem-estar futuro ignora a necessidade de investigação clínica das causas dos transtornos do sono. Doenças que aumentam a inflamação do corpo, como diabetes e doença celíaca, se constituem em diagnósticos diferenciais causais e podem ter essa identificação atrasada pela ausência de análise. O paciente é quem será prejudicado.

Assim, as causas clínicas da insônia raramente são investigadas e as demais consequências do uso indiscriminado de benzodiazepínicos, como dependência e alterações de memória, embora relativamente comuns no abuso, dificilmente são associadas ao seu uso. Isso leva ao consumo de mais medicamentos para o tratamento dos efeitos colaterais dos sedativos, colaborando novamente para mais ganhos da indústria, num grande círculo vicioso. É necessário interromper esse ciclo, realizando a correta investigação das queixas dos pacientes, para que eles lucrem, não o acionista da farmacêutica.

É comum que a causa do transtorno do sono esteja nos hábitos dos indivíduos. As soluções ditas naturais, ainda que com respaldo científico, são desacreditadas em detrimento dos produtos da moda. Utilizando-se da irracionalidade consequente a ativação dos circuitos do medo cerebral, um exemplo disso está nas reportagens alarmistas financiadas pela indústria, nas quais mães são orientadas a não dormirem perto do bebê, mas o uso de sedativos em puérperas aumenta a cada dia.

Sempre houve a recomendação de que o uso dessas drogas fosse apenas para casos de exceção, assim como o utilizar medicamentos para emagrecer e a cirurgia bariátrica. No entanto, a sensação que se tem é que todo mundo virou uma exceção, onde o modelo econômico de receita continuada – similar aos streamings de séries e vídeos, com entrada de capital recorrentemente – chegou aos medicamentos e a alta lucratividade passou a ser a régua.

*Isabel Braga é mãe, médica e doutora pela Fiocruz, com formação em Medicina e Direito, além de especializações em Medicina do Trabalho, Psiquiatria e mestrado em Saúde Coletiva. Autora de diversos artigos científicos contemplada pelo prêmio Eric Roger Wroclawski em 2017 autora do livro “Noites de Renovação”.

...
Você pode gostar também
Deixe uma resposta

Seu endereço de email não será publicado.