Uma lembrança e um tributo a Jacó Carlos Diel

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O Jornal do Oeste não é o primeiro jornal que nasceu e circulou em Toledo. Mas, com toda certeza, Jacó Carlos Diel, o fundador do Jornal do Oeste, foi o mais idealista e realizador na área. Prova disto é que o Jornal está aí, cada dia mais forte, em pleno crescimento na sede própria que Jacó construiu.

Quero aqui, passado o primeiro e triste impacto decorrente da partida do Jacó, deixar um testemunho do idealismo e obstinação do Jacó. Obstinação que não raras vezes era entendida como chatice. Não poucos chamaram o Jacó de “mala”. Mas existia uma desculpa para tal comportamento: Jacó tinha pressa em fazer, em realizar, em consolidar o jornal. E sua pressa, sua ansiedade, nem sempre eram entendidas como tal.

Conheci Jacó ainda na antiga Coopagro e depois firmamos amizade quando ele me procurou em busca de conselho relativamente a questões do movimento estudantil de Toledo (Jacó soube que eu havia sido presidente da União Paranaense dos Estudantes Secundários, em Curitiba).

E assim vi como natural quando no início de 1984, quando ele ainda cursava filosofia na Facitol (atual Unioeste), me procurou em busca de orientação sobre como criar empresa para editar jornal, se era necessário ter jornalista responsável, etc. E logo em seguida, no final de janeiro de 1984, surgiu a empresa, com objeto principal de composição e impressão de jornais, que depois seria a proprietária do Jornal do Oeste, tendo Jacó e a esposa Neide Carletto Diel, e mais o Almir Schnorrenberger como sócios, tendo como capital social uma linha telefônica, uma motocicleta 125 e um pouco de dinheiro, por sinal bem pouco, questão de dois ou três mil reais de hoje. Regularizada a empresa, que tinha sede na Avenida Maripá, em maio do mesmo ano circulou a primeira edição do Jornal do Oeste, que inicialmente era impresso na gráfica da Folha de Londrina.

Só que Jacó não parou. Ainda em 1984 mudou a sede do Jornal para a Rua XV de Novembro, no início de 1986 comprou um veículo Gol para o Jornal, transferiu a sede do Jornal para a Avenida Parigot de Souza (onde hoje é loja Pitstop ao lado da Avenida Autopeças) e depois, no final de 1986 ou início de 1987 Jacó comprou uma impressora rotativa, se não me falha a memória do ano de 1925, e igualmente comprou seis máquinas denominadas linotipo (semelhante a uma grande máquina de escrever), com as quais inicialmente o texto era fundido em linhas de chumbo e depois consolidado, a partir da ordenação das linhas de chumbo, numa chapa. Mas os clichês (chapas que permitiam a impressão de fotografias), ainda eram feitos em Cascavel e o sacrifício de levar o material para Cascavel, esperar que o clichê fosse feito, trazê-lo para Toledo para depois montar a chapa final para impressão, era trabalho que às vezes exigia a noite toda. Não raro o Jornal só começava a circular ao meio-dia. Mas, apesar das dificuldades e sacrifícios, o Jornal do Oeste era impresso em equipamentos próprios.  Ainda em 1987 Almir deixou de ser sócio, permanecendo somente Jacó e a esposa Neide. Também neste ano Jacó terminou a edificação da sede do Jornal do Oeste, sede esta que é a mesma até hoje.

Não lembro se em 1988 ou 1999 Jacó comprou uma máquina rotoplana, enorme e muito antiga, com a qual passou a imprimir o jornal com mais rapidez e economia. O problema era a manutenção da tal máquina, pois muito antiga, não se encontrava peças (quando quebrava alguma peça a mesma tinha que ser feitas por torno), sem contar que não existia pessoal que prestasse manutenção e nem pessoal habilitado para operar aquele monstrengo. Só que, com a vinda da referida máquina, Jacó também instalou um laboratório para a produção dos filmes e das chapas que serviam para imprimir o jornal. A confecção do jornal, ainda que com equipamentos velhos, estava se modernizando.

Mas Jacó queria mais, muito mais. Foi para a Índia pois que naquele país eram fabricadas excelentes máquinas de impressão conhecidas como “offset” ou, entre nós, de ofsete.

Voltou entusiasmado, mas a questão era conseguir os dólares para a compra. Não conseguiu, pois até então grande parte do crescimento do Jornal do Oeste era decorrente de trocas comerciais. Jacó tinha uma capacidade imensa de convencer o empresariado a trocar mercadorias por anúncios no jornal. Só que isto não podia ser feito com empresa da Índia.

E então Jacó passou a buscar uma impressora ofsete por aqui mesmo, mas não chegou a conseguir seu intento.

E não conseguiu, embora tenha arquitetado múltiplos planos para tal, dado que a crise era enorme (era o período da chamada década perdida – 1980/1990), culminando com a hiperinflação que, nos primeiros meses de 1990, chegou ao estratosférico patamar de pouco mais de 82% ao mês. Era plano atrás de plano, troca de moeda, inflação galopante, descontrole total da economia.

Na sequência veio o Plano Collor I, o bloqueio da poupança, o Plano Collor II, o Plano Marcílio, o “impeachment” de Collor, o retorno da inflação (quase 50% no mês de junho de 1995), depois a URV, depois o Plano Real, enfim, uma sucessão de medidas que fizeram a economia virar uma bagunça, nossa moeda pouco valer frente ao dólar e os produtos importados rarear, pois que inexistia crédito para o Brasil, e para os brasileiros de forma geral, comprar no exterior.

Tal situação atingiu o Jornal do Oeste em cheio, pois que os anúncios comerciais minguaram, as assinaturas diminuíram muito e, na outra ponta, o papel e os demais insumos, sendo cotados em dólar, aumentavam todo dia, tornando impossível qualquer planejamento racional. Se você vende e compra em moeda local a questão é uma. Mas se você vende em moeda local e compra em dólar, ou você tem suporte para aguentar ou você quebra. E mais: no final da década de oitenta e início da de noventa ninguém mais inovava, buscava aumentar a produção, ninguém mais anunciava nos meios de comunicação; todos trabalhavam dia e noite para não ser engolido pela inflação e assim a prioridade era, diariamente, aplicar no famoso sistema “overnight” para se proteger da inflação.

Com o plano real em 1994 a situação começou a melhorar, mas para o Jacó era tarde: tinha muitas dívidas e a atividade econômica foi restabelecendo-se devagar.

Coincidiu que Jacó viu possibilidade de recomeçar em Ponta Grossa e para lá foi, porém antes vendendo, em 1995, ele e a esposa Neide, a empresa, para um grupo de empresários de Toledo, os quais, depois, como isto fazia parte do preço, se encarregaram de liquidar todos os débitos do Jornal do Oeste. Ninguém pode falar que Jacó ou sua empresa deixaram de pagar uma dívida.

Jacó deixou o Jornal do Oeste em vista da crise, mas, uma verdade jamais será apagada: Jacó é o criador, o fundador, o pai, tanto que o Jornal do Oeste era conhecido como “jornal do Jacó”. Jacó foi para Ponta Grossa, mas sua obra sobreviveu, venceu as crises, e hoje está ai, com maquinário próprio, com sede própria, com equipe altamente profissional.

É claro que outros tiveram méritos. É claro que hoje outros tem méritos pela continuidade da obra inicial de Jacó, mas, a criação, é do Jacó, auxiliado pela esposa Neide Carletto Diel.

Estive com Jacó há cerca de quatro meses, em Balneário Camboriú, almoçando na casa do mesmo, tendo a esposa Neide preparado uma macarronada como só ela sabe fazer. Foram os últimos momentos de alegria, de muitos e muitos outros anteriores.

Jacó Carlos Diel se foi, mais uma vítima deste maldito Covid, mas sua memória, e principalmente sua obra, continuará não só com os filhos que deixa (Carla, Jacó Junior e Luiz Fernando), não só com os cinco netos, mas também entre nós, perenizando sua memória.

Sérgio Canan é advogado e professor universitário