Presidente da Codevasf diz que só faz pagamentos previstos no orçamento secreto

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Em audiência na Câmara para explicar o orçamento secreto, o presidente da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), Marcelo Moreira Pinto, afirmou nesta terça-feira, 29, que a estatal só cumpre os pagamentos determinados pelo Ministério do Desenvolvimento Regional.

Moreira Pinto afirmou ainda que a empresa estatal chefiada por ele recebeu e empenhou R$ 1,6 bilhão em 2020 em recursos de emenda de relator-geral do Orçamento, da sigla RP 9, o orçamento secreto. “Nós não recebemos os ofícios com cotas dos parlamentares”, relatou Moreira durante a sessão. “Quando chega à Codevasf, os TEDs (Termos de Execução Descentralizadas) já chegam carimbados, com o fim que deve ser dado”, afirmou. “Recebemos recursos públicos do ministério de forma transparente.”

Segundo avaliação de parlamentares, o presidente da estatal sugeriu que a distribuição das verbas secretas está concentrada no Ministério do Desenvolvimento Regional, chefiado por Rogério Marinho. O relato apontou também um baixo grau de autonomia da empresa estatal para definir políticas públicas. Moreira Pinto, que falou à Comissão de Fiscalização Financeira e Controle por mais de 3 horas, é apadrinhado político do deputado Elmar Nascimento (DEM-BA) e próximo ao senador Davi Alcolumbre (DEM-AP).

Em maio, o Estadão revelou que a pasta de Rogério Marinho, com aval do ministro Luiz Eduardo Ramos, então chefe da Secretaria de Governo da Presidência, distribuiu mais de R$ 3 bilhões em emenda de relator-geral, no final do ano passado, para parlamentares. A liberação da verba ocorreu durante negociação para eleger os candidatos governistas às presidências da Câmara e do Senado, Arthur Lira (Progressistas-AL) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG), respectivamente. Do total, R$ 900 milhões foram para a Codevasf, por meio dos TEDs.

Apesar de afirmar que há transparência sobre as informações da liberação as verbas, ele confirmou que a estatal não divulga no seu site os ofícios enviados pelos parlamentares para direcionar recursos. “Também não publicamos todos os documentos que compõem o processo. Seria uma coisa desumana, né? Mas todos esses documentos estão arquivados.”

A falta de transparência e a ausência de critérios técnicos das indicações dos parlamentares para as emendas estão sob análise do Tribunal de Contas da União (TCU) e do Supremo Tribunal Federal (STF). Hoje, o TCU julgará as contas do governo federal de 2020. Em sua avaliação, que consta no relatório sobre as contabilidade da União, a Secretaria de Macroavaliação Governamental concluiu que o uso das emendas RP 9 fere a Constituição.

Para limitar a farra com as emendas de relator, a unidade técnica do TCU propõe que o plenário recomende à Presidência e ao Ministério da Economia que deem ampla publicidade aos documentos que contenham as solicitações de parlamentares para o uso do RP 9, tanto em 2020 como neste ano. A outra recomendação, voltada para o orçamento de 2021, ainda em execução, é que o governo adote medidas para que as demandas de parlamentares voltadas para distribuição de emendas de relator-geral, independentemente da modalidade de aplicação, sejam registradas em plataforma eletrônica mantida pelo órgão central do Sistema de Planejamento e Orçamento Federal.

O Estadão apurou que a tendência na Corte é que as recomendações sejam aprovadas pelo plenário, mas interlocutores do governo têm tentado demover os ministros do tribunal dessa ideia. O Palácio do Planalto conta especialmente com a defesa do ministro Jorge Oliveira, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro. O relator das contas da Presidência é o ministro Walton Alencar Rodrigues, que é da carreira do TCU.

Durante a sessão da Câmara, a deputada Adriana Ventura (Novo-SP) questionou o presidente da Codevasf sobre o “uso político exagerado” das emendas de relator-geral. “Eu preciso saber por que é que um parlamentar indica R$ 70 milhões, outros R$ 2 milhões, e outros nada”, disse. “Estão fazendo orçamento impositivo paralelo, para exercer o toma lá dá cá, essa que é a denúncia que está sendo feita”, afirmou, por sua vez, o deputado Rogério Correia (PT-MG).

Moreira recomendou que os questionamentos fossem direcionados à pasta do Desenvolvimento Regional. “Articulação parlamentar não faz parte da minha alçada, nossa obrigação é executar o orçamento”, disse. Ele também negou haver superfaturamento na compra de máquinas e equipamentos e na realização de obras – tema de apuração em andamento no TCU e na Controladoria-Geral da União. Rogério Correia informou que pedirá acesso ao conteúdo das apurações da CGU sobre as compras acima da tabela.

Marcel van Hattem questionou a legitimidade de a empresa ter uma ouvidoria – órgão responsável por receber e encaminhar denúncias – chefiada pelo filho de um senador da República que integra o centrão. “Em relação ao ouvidor da empresa, que hoje é o Leonardo Ferrer, ele realmente é filho do senador (Elmano Ferrer, do Progressistas-PI)”, reconheceu o presidente da Codevasf, que concluiu: “Porém, passou pelos critérios de avaliação técnica e foi aprovado pelo Conselho de Administração.”