O acerto de contas final

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Ouvi falar, que um homem muito rico e bondoso, morreu e foi recebido no céu. Lá contaram-lhe que tudo parecia com a vida na Terra, apenas a forma de se entender as coisas era um pouco diferente. O Anjo Guardião levou-o por várias alamedas e foi lhe mostrando as moradias que ali existiam, até que chegasse em sua nova casa.

            Passaram por uma linda morada com belos jardins e piscinas. O homem, admirado perguntou: – Que linda casa, quem mora aí? O anjo respondeu:- É o Felisberto, aquele seu motorista que morreu no ano passado, vítima de um assalto. O homem ficou pensando: – Puxa! Se o “Felis” tem uma casa dessas, aqui deve ser muito bom!

            Andando mais um pouco, cercada por um muro e arames farpados encontrou uma casinha feita de latas de óleo, em que o barro e a sujeira atolavam o lugar. De fora se ouvia apenas  gemidos e lamentações. E perguntou: – Quem mora ali? O anjo guardião respondeu: – São os assaltantes que mataram o seu motorista, e aqueles que tinham poder para conter a violência, mas que por pensarem apenas em seus projetos pessoais nada fizeram. Mas não fique chocado, pois a cada dia pela ordem do tempo e do merecimento, o lugar ficará com maior lotação e piores condições, até que todos respondam por seus atos na terra. E isso ainda levará muito tempo ….

            Logo a seguir, surgiu uma outra casa muito bonita e ele perguntou mais admirado ainda: – E aqui, quem mora?
O anjo respondeu:- Aqui é a casa da Mimosa, aquela que foi cozinheira de seu vizinho arrogante que se fazia de rico, aquele que passava sempre pela frente dos vizinhos mais simples e nunca os cumprimentava. Ela morreu na fila do hospital sem atendimento, porque alguns governantes desviaram o dinheiro da saúde para contas fora do país.

             Observou logo mais adiante, uma barraca de lona e chão batido onde muitas pessoas estavam deitadas no chão gemendo de dor, enquanto os mosquitos e pragas lhes importunavam sem cessar um só segundo, e perguntou: – Quem são aqueles e por que estão assim? Aqueles são os governantes e seus cúmplices que pelo desvio de recursos, deixaram milhares de pessoas morrerem sem atendimento nas filas dos hospitais. Juntos estão também muitos profissionais omissos, que pensaram mais no dinheiro do que na vida das pessoas. 

            Andando mais um pouquinho, observou em um grande buraco, uma multidão de homens e mulheres completamente nus, presos uns aos outros por cordas amarradas na cintura. De um lado do corpo ardiam pelo calor do fogo, do outro congelavam pelo frio do gelo.  E o homem perguntou: – Quem são, o que fizeram para merecerem isso? O anjo guardião respondeu: – Aqueles eram homens que em nome da moral e do bem comum defendiam os direitos da sociedade. Se intitulavam perfeitos, honestos e solidários às necessidades do povo. Quando lhes demos o poder para mudar tudo, viraram as costas as necessidades reais do povo, tornado-os seus escravos. Doando um pouco de esmolas e um prato de comida, acharam que sua parte já estava feita. Na realidade, venderam a alma ao poder, ao prazer, ao dinheiro, às festas, às bebidas, a carros e trajes caríssimos. Uniram-se aos seus velhos inimigos e resolveram esquecer de onde vieram. Esses ficarão uma eternidade sob a tutela do fogo que não consome e do frio que não alenta.

             O homem ficou imaginando que tendo aquelas pessoas passado por muitas dificuldades na Terra e agora possuindo magníficas residências no céu, sua morada deveria ser muito pequena e pobre, pois sua vida inteira tinha ido rico, feliz e morado em belas mansões.

Já estava conformado com o que o destino lhe reservaria, quando o anjo parou em frente a um magnífico palácio construído no centro de um lindo lago. Lá os pássaros cantavam as mais lindas melodias, os peixes saltavam e dançavam de alegria, e muitas espécies de animais brincavam sem preocupação. – Essa é a sua casa! Disse o Anjo Guardião.

            O homem não pode acreditar e perguntou: – O que fiz eu de tão proveitoso na vida para merecer isso? Nisso uma imagem colorida de sua vida passou a sua frente. Nela o anjo guardião narrou os momentos em que ajudou muitas pessoas, inclusive quando amparou as famílias do Felisberto e da Mimosa nos momentos mais difíceis.

             A imagem mais brilhante, aconteceu quando apareceu em sua casa brincado com os filhos e a esposa. Então o anjo disse: – Aqui está o seu maior mérito. Sua família. Sempre ensinou a os valores corretos da vida. A paz, a solidariedade, o amor, a justiça e a fé. Nunca deixou que a inveja e a raiva tomassem conta de seu lar. Seus exemplos sempre foram um espelho para seus filhos, que aprenderam direitinho com o pai. Pois é, eles serão homens de bem, frutos da árvore que você plantou na Terra.  Farão coisas maravilhosas para a humanidade, e nunca se deixarão iludir pelo lado oculto do dinheiro e do poder. Serão justos, corretos e participarão da transformação de muitas pessoas e do mundo. Sua casa agora é essa, e precisa ser muito grande, pois a ela virão muitos e muitas de sua antiga descendência. Então o homem rico e bondoso fez uma última pergunta: – Como poderei viver em paz, com tantas pessoas sofrendo ao meu redor logo ali na esquina? O Anjo respondeu: – A partir de agora, nunca mais as verá, mas elas o verão a todo o momento, pois estão no lugar, onde o peso e o tormento de suas consciências as conduziram. Quanto a você, saboreie dos frutos que plantou! 

Um abraço do Klaue!              

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