A casa do meu pai…

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Meu pai faleceu há quatro anos. Recentemente, passava em frente da casa onde ele pai viveu por um longo período e olhei para ela com nostalgia. Ali, na casa do meu pai, vivemos muitas boas experiências que trago comigo. Foram festas, abraços, carinho e respeito que sempre estiveram presentes nas nossas interações familiares. Falei para o meu irmão:

– A casa do pai continua vazia.

– Pois é, ele achava que a casa era dele…

Primeiro não entendi. Do que ele está falando? Lógico que a casa era do pai, pensei. Na sequência entendi o que o meu irmão estava dizendo. Ele simplesmente dizia que nada nos pertence e que somos apenas usuários daquilo que experimentamos, podem ser as posses e podem ser as poses. As posses estão relacionadas com aquilo que acreditamos que possuímos. As poses fazem referência aos papéis que desempenhamos. Nada nos pertence e não somos nada daquilo que representamos. Afinal, o que temos e quem somos?

Uma boa parte das pessoas passa a vida correndo atrás de possuir casas, carros ou empresas, entre outras coisas, aos quais se referem como “meus” bens. Outras tantas pessoas passam a vida lutando para desempenhar papéis que julgam importantes, como uma função política, um alto cargo na organização ou um título acadêmico, entre outros papéis de suposto status. Não estou querendo dizer que não se possa desfrutar de uma casa que nos proporcione comodidade; ou que não se deva usar um carro para se deslocar com mais rapidez; ou ainda a não querer empreender ao criar uma empresa. Da mesma forma, não estou defendendo que as pessoas não queiram desempenhar determinados papéis na sua trajetória, como a se envolver na política; ou a evoluir na hierarquia da organização; ou ainda a seguir uma carreira acadêmica. O que quero dizer é que devemos ter a consciência de que somos apenas usuários de tudo aquilo que imaginamos que possuímos, assim como apenas desempenhamos determinados papéis que as funções exigem. Por isso, a casa será nossa enquanto a usarmos, porque depois outro a usará. O carro será nosso enquanto estiver a nosso serviço, porque em seguida ele prestará o mesmo serviço para outra pessoa. A empresa será nossa e de todos aqueles que nela estiverem enquanto para ela estivermos contribuindo. Nada disso nos pertence. Os papéis que desempenhamos? Não entendo a necessidade de que as pessoas se engalfinhem em guerras de manipulação para alcançar um cargo político, ou uma alta posição hierárquica numa organização ou ainda um título de catedrático considerado importante. Muitas vezes, as pessoas se esquecem que elas nunca serão mais do que realmente são pelo papel que desempenham. Basta lembrar que no instante em que deixarem o papel outro o assumirá e a vida seguirá. O imperador romano Júlio César que o diga. Nós não somos nenhum dos papéis que representamos.

Enfim, olhar para a “casa do meu pai”, local onde passamos tantos bons momentos e ser lembrado de que ela nunca foi propriedade dele, me traz a consciência de que todos nós somos temporários. Não possuímos casas, mas podemos fazer dela um bom lar. Não possuímos carros, mas podemos escolher os lugares a que eles podem nos levar. Não somos donos de empresas, mas podemos fazer delas um lugar para as pessoas se desenvolverem. Da mesma forma, estar numa função política, num alto cargo organizacional ou numa boa posição acadêmica é apenas um papel que pode ser representado com dignidade de um ser humano que tem a consciência de que tudo é temporário. Enfim, se as “nossas posses e as nossas poses” não servirem para que sejamos seres humanos melhores seria melhor que não tivéssemos acesso a elas. Porque no final, nós não possuímos nada daquilo que acreditamos que temos e nós não somos nada daquilo que é atribuído ao papel que representamos.

O que você possui? Quem é você?

Moacir Rauber

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